Pronto... Tenho mesmo que falar do filme.
Há uns dias atrás propus-me encetar a hercúlea tarefa de ver um dos mais propalados filmes de terror de todos os tempos: The Texas Chain Saw Massacre. Acreditem: há muito tempo que era um daqueles filmes que me estava aqui atravessado, com a gula de passar pela retina, mas empenhado em embirrar num qualquer contratempo ou, mais provavelmente, imiscuir-se num cantinho recôndito da minha mente, onde acabou sempre por ser esquecido... até... há uns dias atrás.
Numa primeira leitura, ainda a quente, TTCSM (vou abreviar porque senão perco metade do tempo e do espaço do post a escrever o nome completo do filme), pareceu-me completamente vazio. Vazio no sentido em que o argumento em que se molda para construir o filme propriamente dito é falaciosamente básico. Em termos mais simples e actuais, aparentemente TTCSM não dá que pensar. Dirá talvez quem o vir hoje: "Epá, é o mesmo de sempre: uns quantos jovens numa viagem, uns psicopatas, mortos e algum sangue". A diferença está no facto de ter sido rodado em 1973, quando todos os disinspirados blockbusters que de uma forma ou de outra buscaram influências no clássico de 74 ainda não tinham saído das bobines onde sempre deviam ter ficado. Falo de "coisas" como A Casa de Cera, A Casa dos 1001 Cadáveres ou mesmo dos remakes de The Texas Chain Saw Massacre de 2003 e 2006.
Tobe Hooper foi o primeiro realizador a levar a cabo a tarefa de realizar um filme centrado apenas e só na violência, sem recurso às modernas paródias e truques de suspense. Mais ainda, Hooper propõs-se fazer um filme onde a violência extrema é única e exclusivamente de cariz humano, coisa que até aí havia sido explorada apenas de forma muito leve por Hitchock, em filmes como Psico (onde Hooper se inspirou para TTCSM) e em Pássaros.
Ora, se para um purista do cinema actual, um filme deve ser mais do que mero produto de entretenimento, TTCSM é um dos primeiros do género engavetado dos Horror Movies que deixa várias questões interessantes no ar: qual a razão da violência por si só? Qual a origem dos sentimentos que perpetuam a violência humana? Que segredos encerra a perversa mente humana, que consegue congeminar os planos mais malévolos para simplesmente torturar e matar?
Estas são questões a que o filme não responde, com toda a legitimidade. Por quererem responder a estas e outras questões, é que as sequelas dos clássicos são, na sua maioria, lixo cinematográfico.
TTCSM não esclarece nada. Vive apenas de uma pequena road-trip (importante para contextualizar o desenrolar das acções seguintes), de perseguições de moto-serra em punho e de actos de violência puros, com vicíos canibalistas à mistura (olá Hannibal Lecter). E é por não viver dos pequenos recursos e truques de suspense tão caros aos blockbusters do género de hoje em dia e de que falei algumas linhas acima, que o filme se torna tão real e deixa marcas na retina dos espectadores. É por recorrer às palhaçadas e a esses mesmos truques que "As casas de cera e dos 1001 cadáveres", se tornam eles próprios em pálidas caricaturas das influências de que nunca se deveriam ter apropriado.
Este discorrer teclístico teria ainda muito que contar, mas como normalmente nos filmes que me marcam ficam sempre imagens impagáveis, deixo-vos com uma entrevista e com uma aferição curiosa que retirei depois de recordar a cena final de TTCSM. Para quem já viu 2001-Odisseia no Espaço e está recordado da cena inicial - que interpretei como a metáfora da criação humana na famosa cena dos macacos geneticamente imbuídos do futuro espírito humano-, verá no final de TTCSM uma cena que, na minha perspectiva, é o estado último desse provável primeiro esboço da criação humana segundo Kubrick.
Uma das melhores cenas de cinema de todos os tempos, com recurso a um homem, uma moto-serra e movimentos endiabrados sob um pôr-do-sol que augurava um calor inhumano.
Preparem-se para sequências infindáveis de gritaria ensurdecedora.
2 comentários:
Esse é um dos filmes que tenho resistido a ver, nunca me interessou especialmente mas aguçaste-me um pouco a curiosidade.
Não aprecio muito filmes violentos mas alguns conseguem fazer-me pensar. O "Ichi the Killer", um dos filmes mais violentos que já vi fez-me pensar e sentir a violência como algo que faz parte da minha natureza e talvez seja tão pertinente como outros traços do meu carácter. Claro que se tratava de um estremo de violência, mas um estremo que reflectia de forma agigantada um instinto que existe dentro de todos nós.
Gostei de "A casa dos 1000 cadáveres", surpreendeu-me pela agonia que a loucura do filme me causou. Era tudo tão insano que parecia saído da cabeça de alguém bem-humorado que está numa bad trip.
Este "massacre" dá que pensar, e, como referi no post, foi a mola propulsora para quase tudo o que de mau terror série B fingido se fez. A Casa dos 1000 Cadáveres é um pastiche apalhaçado entre o Massacre no Texas e o Pesadelo em Elm Street I.
O género "terror" é muito promíscuo. Deve ser bem escolhido e consumido com cautela. Pode vir fora de prazo...
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