terça-feira, março 31, 2009

Gran Torino - Transformação Inevitável



Gran Torino marca o regresso de Clint Eastwood ao duplo papel de realizador/actor, depois de ter realizado Changeling o ano passado. Mais do que o regresso de Eastwood ao papel de actor, Gran Torino é o reflexo esbatido no espelho da súmula de toda a sua carreira.
A pele que veste é a de um Harry Callahan envelhecido, ou mesmo de um blondie (O Bom, o Mau e o Vilão) do séc. XXI.
Walt Kowalski é um veterano de guerra da Coreia, arrogante, solitário e xenófobo entregue à sua rotina enfadonha num pequeno bairro de Detroit.
"Orfão" de família, recém viúvo, impermeável à palavra de deus, e renitente às mudanças sociais que se fazem sentir no seu país, Kowalski vive circundado por um clima de violência latente com confrontos constantes entre gangs de diferentes etnias.

Com a chegada ao bairro de novos vizinhos Hmong, de etnia asiática, Kowalski pouco mais pode fazer do que maldizer a sua sorte e repelir alguns dos vizinhos que se atrevem a passar a fronteira do seu pequeno território limitado pela relva defronte da sua moradia.
Contra a sua vontade Kowalski é obrigado a intervir numa briga familiar que envolve um jovem vizinho Hmong. De forma gradual Kowalski vai construindo uma relação de confiança com o jovem, ao mesmo tempo que vai desconfigurando a sua personalidade rude e grosseira.
É aqui mesmo neste ponto que reside a genialidade de Gran Torino. A forma como Eastwood reveste a personagem de Kowalski com o mito das suas anteriores personagens - o referido Harry Callahan, o cowboy "seco" dos westerns de Sergio Leone, Bill Munny de Imperdoável ou Terry McCaleb de Dívida de Sangue -, todos eles rebeldes, marginais e de alguma forma fragilizados pelo sistema ou (mais recentemente) pelo estado de saúde, para depois tornear esse mesmo mito e descobrir um outro ser humano nascido dessa mesma desconfiguração da personagem atrás referida.

Eastwood sucumbe, de forma sublime, à tentação de humanizar e redimir o universo que construiu ao longo da sua extensa carreira. Não desvirtuou a sua linguagem, não entrou no plano da lamechice e construiu um filme que, em menos de duas horas faz a ponte entre um estereótipo de actor e a inevitabilidade da sua transformação.
A direcção de actores é genial - Ahney Her no papel de Sue tem um desempenho fantástico, tal como Hillary Swank em Million Dollar Baby e Angelina Jolie em Changeling também já o haviam tido.

A canção do genérico final composta por Eastwood, Kyle Eastwood (seu filho) e Jamie Cullum, onde o actor tem uma pequena participação vocal deixa-me colado à cadeira com a estranha sensação de estar a assistir ao velório de um actor muito especial.

Sorrio e saio.

Obrigado. Descansa em paz... Harry Callahan.

1 comentário:

Anónimo disse...

tão united states...