quarta-feira, setembro 24, 2008

A Anedota em 3 Dimensões


A expressão é do meu primo "austríaco" e refere-se ao nosso cantinho de brandos e estupidificantes costumes.
Não. Não se trata de um ataque de mau humor. Na verdade até me encontro muito bem disposto (ao contrário do que diriam muitos conterrâneos na mesma situação que eu). A anedota é um rectângulo, polvilhado aqui e acolá de pequenas reentrâncias e saliências. Constituiu-se como pátria há oito séculos e em pseudo anedótica democracia há apenas 33 anos.
A cultura reduz-se ao futebol dos pequeninos, à tourada, à chanfana de cabrito, às árvores de Natal gigantes e aos eventos insuflados de pompa e circunstância - o mesmo é dizer, de vazio, de falta de ética, de valores, de civismo. No entanto, continuamos sempre a achar que somos os maiores. O ego incha com o futebol, mas acabrunha-se com o depauperado Sistema Nacional de Saúde, com a Educação e a Formação de cidadãos, com as estruturas inadaptadas às exigências e necessidades do Séc. XXI. Deixamos andar o barco à deriva. Somos cúmplices do clientelismo, das cunhas e dos compadrios, fechamos os olhos aos lobbys imoboliários que violam os PDM's e destroiem literalmente a qualidade de vida das nossas vilas e cidades, observamos silenciosamente a aprovação da proposta de um TGV que vai servir apenas as empresas implicadas na reestruturação de toda a linha, à custa de uns bons milhões de euros que dariam certamente para criar melhores condições na Educação, na Saúde, na reestruturação da rede viária secundária e da rede ferroviária que numa grande parte dos troços tem apenas uma via (linha do Oeste, linha da Beira Interior).
Num país com menos de 100.000 km2 se precisar de viajar de Castelo Branco a Faro vou ter de percorrer cerca de 450 km em 8 horas, com provável mudança de autocarro em Lisboa. O país está desmantelado.
Previligiamos o Luxo, o Ócio, o Desenrasca. Previdenciam-se favores aqui e acolá porque até conhecemos o Sr. vereador (ainda ontem estive nos copos com ele até às 3 da matina). Saudamos o superfluo e ostentamos o material descartável mesmo que ganhemos 500 ou 600 € por mês.
A crise de valores confunde-se com o vazio de ideias e as mentalidades teimam em não mudar num ciclo perpétuo.

A anedota é apenas um pouco disto que aqui registo. E por todas estas circunstâncias, os verdadeiros cidadãos portugueses acabam por sair para outras paragens, regressando apenas para apanhar o sol do Verão e saudar a família.
A resposta do meu primo quando o confrontei com um possível regresso permanente a Portugal foi a seguinte: "Para quê? Para ir projectar vivendazinhas à beira-mar, ou assinar projectos que violam não apenas o regulamento dos PDM's mas também a moral e o bom senso de um povo que olha primeiro para o acessório e só depois, muito mais tarde para aquilo que é verdadeiramente essencial?"

Está na Áustria, por lá se vai manter, talvez com a esperança de que esta Anedota se venha a tornar apenas numa piadinha privada... a 3 dimensões, claro está...


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